Avanços e retrocessos na Gaúcha
2007
Luiz Artur Ferraretto

Contratação de Ruy Carlos Ostermann pela RBS (março de 1978)
Da esquerda para a direita, Fernando Miranda, diretor da TV Gaúcha; Nelson Pacheco Sirotsky, diretor da Rádio Gaúcha; Ruy Carlos Ostermann; e Lauro Schirmer, diretor de redação, e Carlos Fehlberg, editor-chefe, ambos do jornal Zero Hora.
Fonte: Zero Hora, Porto Alegre, 10 mar. 1978. p. 1.

O jornalista Ruy Carlos Ostermann chega em 1978 à Rede Brasil Sul para qualificar a cobertura esportiva do jornal Zero Hora, da Rádio e da TV Gaúcha. Até o início da década seguinte, a sua trajetória exemplifica os avanços e retrocessos da RBS em caracterizar a Gaúcha como uma emissora dedicada exclusivamente ao radiojornalismo, algo como dar dois passos à frente e um para trás.

Na segunda metade da década de 1970, o grupo da família Sirotsky procura identificar estratégias que reforcem a competitividade da Gaúcha em relação à líder do mercado de radiojornalismo na época, a Guaíba. Um pouco antes, por iniciativa de Nelson Sirotsky, a emissora da RBS havia realizado, com algum sucesso, a cobertura da Copa do Mundo de 1974 na Alemanha. A emissora, no quadro de indefinições da época, comete um erro estratégico e dá uma guinada para o popular, contratando Jair Brito para comandar a sua programação. O fracasso desta proposta leva a novas tentativas no rumo do jornalismo.

Apesar da programação ainda eclética, um marco neste processo é a cobertura do incêndio das Lojas Renner, no dia 27 de abril de 1976, que comprova mais uma vez o potencial do jornalismo como segmento de mercado e demonstra que, naquele momento, a equipe de reportagem da Gaúcha constitui-se na mais estruturada do rádio porto-alegrense. Com Celso Ferreira no estúdio, Carlos Bastos na retaguarda de produção e Sérgio Lima na chefia dos repórteres, a emissora coloca duas unidades móveis no palco de ação do fato e deixa outra no Hospital de Pronto Socorro, enquanto uma quarta movimenta-se pela cidade na repercussão do maior incidente deste tipo até então registrado no Rio Grande do Sul.

O ano seguinte, 1977, começa com a Gaúcha completando cinco décadas, oportunidade para reforçar a imagem da emissora junto aos ouvintes, repercutindo as comemorações do cinquentenário nos outros veículos da Rede Brasil Sul. Oportunidade também para que a rádio redefina seu posicionamento no mercado, voltando-se para as classes A e B. O chefe do Departamento de Notícias e Esportes da Gaúcha, Luiz Figueredo, tem, então, por objetivo tornar a programação mais sóbria sem deixar de lado a qualidade, como ele descreve, na época, para a revista Cadernos de Jornalismo, do Sindicato dos Jornalistas de Porto Alegre:

– Através de reuniões de um Comitê de Criatividade, que foi criado para analisar a programação da rádio e sugerir alterações, estamos procurando tornar a Gaúcha mais sóbria, sem perder suas características de dinamismo e flexibilidade. Criamos, por exemplo, o noticiário Zero Hora Primeira Edição, que analisa os principais acontecimentos do dia. Em vez de basearmos toda a programação no uso das unidades móveis, estamos colocando músicas selecionadas. As vinhetas exageradas, que até há pouco eram utilizadas, estão sendo substituídas. Tudo isso visa valorizar o profissional e realizar um trabalho com mais condições, para alcançar um público de classe AB.

Nesta linha de raciocínio, fazendo frente ao Agora, da Rádio Guaíba, entra no ar, às 8h do dia 1° de agosto de 1977, o programa Atualidade, apresentado por Jorge Alberto Mendes Ribeiro e incluindo reportagens e entrevistas sobre os assuntos do dia. A Gaúcha começa, assim, a analisar as barreiras impostas ao seu crescimento pela emissora ligada à Companhia Jornalística Caldas Júnior. Mais do que isto, tenta explorar as incoerências do modelo de rádio e empresa da emissora. Se os pontos fortes da Guaíba são ainda a credibilidade, a tradição e a qualidade de som – ao que se soma um bem estruturado Departamento de Esportes –, a estação de Breno Caldas, ao mesmo tempo, peca pelas dificuldades de adaptação administrativa e tecnológica. A Rede Brasil Sul procura, portanto, em sua investida, dar mais sobriedade e qualificar a programação da Gaúcha para, logo depois, em 1978, apostar no aumento da potência dos transmissores para 100 kW e na contratação de Ruy Carlos Ostermann, primeiro grande desfalque na equipe de esportes da Guaíba. A RBS, superando tecnicamente a concorrência e explorando suas deficiências, organiza-se, deste modo, para a cobertura da Copa do Mundo de 1978, na Argentina. Fora isto, o pacote de funções envolvidas na transferência de Ostermann para a Rede Brasil Sul dá mostras do cacife que o grupo começa a jogar na cooptação de profissionais de outras empresas. Além de assumir a chefia do Departamento de Esportes da rádio, o jornalista passa a assinar uma coluna diária em Zero Hora e a apresentar um comentário – o Dois Minutos de Esporte – às 19h40, na TV Gaúcha.

Embora, ao final da Copa do Mundo, os índices do Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística não sejam favoráveis à Gaúcha, que registra 9,57% dos aparelhos ligados contra 16,63% da Guaíba, a sensação entre os profissionais da emissora é de um trabalho bem realizado. Como consequência, em 1979, Ruy Carlos Ostermann assume a direção geral da rádio, implantando um esquema que aproveita a abertura política para se dedicar quase com exclusividade ao jornalismo, restringindo a veiculação de músicas às madrugadas e a um ou outro momento ao longo do dia. Com repórteres desde as primeiras horas da manhã e uma equipe de 40 profissionais, a Gaúcha apresenta uma programação rigorosamente pautada, apostando na qualidade da informação e não mais apenas no carisma dos apresentadores. O custo cresce e, em meio aos boatos de infiltração esquerdista na redação, a Rede Brasil Sul decide demitir 15 jornalistas, alegando redução de despesas e levando a uma greve nos dias 25 e 26 de setembro de 1980, que paralisa o Departamento de Notícias. Ostermann sai fragilizado, ao final do episódio, deixando, em seguida, a direção, mas se mantendo como o principal comentarista esportivo da RBS.

A partir daí, a programação da Gaúcha atravessa, novamente, um período de indefinições que se transforma em retrocesso no mês de janeiro de 1981, quando o jornalismo restringe-se às entrevistas do Atualidade e aos textos informativos do Correspondente Maisonnave, então com quatro edições (8h30, 12h45, 18h30 e 20h30), e do Gaúcha Notícias, veiculado quase de hora em hora (10h, 11h, 12h, 14h, 15h, 16h, 17h, 18h, 22h, 23h e 24h). Pendendo para o popular, programas como Gaúcha Hoje, com Cláudio Monteiro, no início da manhã, e Tudo sob Controle, com Celso Ferreira, à tarde, incluem personagens humorísticos, atendem ouvintes, apresentam listas de preços de feiras livres e música voltada às classes B e C. Com o jornalismo debilitado, mesmo registrando, conforme dados do Ibope, um desempenho em termos de audiência levemente superior ao da Guaíba durante a Copa do Mundo de 1982, na Espanha, a Rede Brasil Sul não consegue atingir em sua plenitude a meta de ultrapassar a estação ligada à Caldas Júnior. Em novembro daquele ano, fracassa a apuração paralela montada pela RBS nas primeiras eleições para o governo do estado desde 1962. Com poucos repórteres próprios e alguns arregimentados de última hora, a cobertura da Gaúcha perde, deste modo, em qualidade e precisão para a da Guaíba. E novos passos adiante serão, logo, necessários. Desta vez, sem retrocessos.

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