“De Washington, Luiz Amaral”
2006
Luiz Artur Ferraretto
Luiz Amaral ao microfone da Voz da América (anos 1980)
Fonte: Acervo particular de Luiz Amaral.
Meu primeiro contato com o Luiz Amaral ocorreu em alguma manhã
ou tarde do início da década de 1980 na biblioteca da Faculdade de
Biblioteconomia e Comunicação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Entre uma aula e outra, inexperiente e muito mal-informado sobre a profissão de
jornalista, encontrei numa estante um dos livros do mestre baiano, não sei se o
Jornalismo, Matéria de Primeira Página
ou o Técnica de Jornal e Periódico.
Estava ali, ao lado dos de Luiz Beltrão e dos de Mario Erbolato. Estes três
juntos, sem conhecê-los pessoalmente, acabaram sendo grandes professores e me
inspiraram a escrever, por exemplo, sobre a técnica do rádio. A eles, devo a
certeza da necessidade de ensinar, a certeza de que, hoje, falta algo na
moderna produção de textos para os bancos universitários de Jornalismo. Enfim,
reflete-se muito e, por vezes, ensina-se pouco, talvez por não existir em
quantidade suficiente, nos bancos universitários, a experiência de vida
profissional destes primeiros autores da, agora, extensa bibliografia
especializada existente no país.
E se, em seus escritos didáticos, Luiz Amaral usou sempre de
um texto simples e direto, o que dizer dos boletins com os quais agraciava os
ouvintes de dezenas de emissoras de todo o país a reproduzirem o material
gerado pela Voz da América, a estação do governo dos Estados Unidos? Cada vez
que o baiano de Ilhéus falava, eu – e, com certeza, muitos outros – punha de
lado minhas restrições ideológicas à rádio fruto da Guerra Fria e do
imperialismo ianque. Era uma informação sóbria, bem descrita e transmitida com
rara habilidade, marcada ao final pela assinatura:
– De Washington, Luiz Amaral.
Na segunda metade da década de 1980,
a rotina nas redações das duas
principais emissoras do Rio Grande do Sul dedicadas ao jornalismo – a Gaúcha e
a Guaíba – incluía, assim, uma ligação telefônica diária ao serviço brasileiro
da Voz da América. Era o meio da época para gravar os boletins do Luiz e de
seus colegas. Prática semelhante valia em relação à British Broadcasting
Corporation, de Londres.
Às vezes, eu via, no estúdio auxiliar da Gaúcha, a editora do
radiojornal Chamada Geral, Vera Monteiro,
gravando esses boletins, que traziam, numa época pré-internet, certa impressão
pessoal, acrescentando informação ao noticiário recebido via teletipo, as
pesadas máquinas por onde chegava o material das agências noticiosas. Lembrava,
então, de outras tardes, dois ou três anos antes, quando, juntando o pouco
dinheiro que tinha, consegui comprar, na Livraria do Globo, um exemplar de Técnica de Jornal e Periódico. Foi a
minha leitura de férias em um momento de dúvidas sobre a correta escolha ou não
da profissão. E sempre vou agradecer ao Luiz por ter escrito este livro em
particular.
Dez anos depois, descobri outro lado dele, o de ser humano
educado e extremamente atencioso com todos. Quando, junto com a Elisa, então
minha namorada, escrevi o livrinho Técnicas
de Redação Radiofônica, alguém fez chegar um exemplar ao Luiz. Recebemos,
na sequência, uma afetuosa mensagem de final de ano, repetida a cada 365 dias –
366 nos bissextos – desde então em todas aquelas datas de confraternização
universal.
Em meados de 1994, conheci pessoalmente o Luiz em Porto Alegre durante
o lançamento de Esses Repórteres...,
deliciosa coletânea de histórias de redação. Um ano depois, estava de volta por
aqui para autografar o ensaio A
Objetividade Jornalística. Acabei acompanhando-o em algumas entrevistas. Em
uma, especialmente, vi toda a técnica e o conhecimento do mestre, esgrimindo
argumentos junto com o principal e mais importante jornalista do Rio Grande do
Sul. Era um fim de tarde chuvoso, típico da época em que Porto Alegre sedia
a sua Feira do Livro e acabamos chegando atrasados na TV Guaíba para o programa
Guerrilheiros da Notícia.
Imediatamente colocado na bancada do programa conduzido por Flávio Alcaraz
Gomes, o Luiz, que não conhecia nenhum dos participantes – talvez o Flávio de
nome –, agiu com a desenvoltura dos grandes profissionais. Os dois deram um
show, com informação e picardia, analisando a eleição presidencial norte-americana
ocorrida dias antes. Na mesma noite, outro momento de emoção. Na TVCom, o
produtor Rogério Carbonera coloca um boletim radiofônico de Luiz Amaral, que se
emociona sob o olhar do apresentador Lauro Quadros. Nas duas emissoras, a prova
do respeito dos jornalistas do Rio Grande do Sul em relação ao mestre.
Lauro Quadros entrevista Luiz Amaral no programa Estúdio 36
(novembro de 1996)
Fonte: TV COM. Estúdio 36. Porto Alegre, nov.
1996. Programa de TV
Com o fim da Guerra Fria, o serviço brasileiro da Voz da
América acabou sendo fechado. O Brasil ficou, a partir daí, sem as informações
precisas do Luiz. Desde então, a cada vez que um atentado ou um conflito de
porte obrigam a interrupção da programação das emissoras, cá neste canto do
Brasil, eu ainda sinto falta dos boletins do Luiz Amaral. Eu e muitos ouvintes,
vários deles sem se darem conta de que perderam alguma coisa muito importante.
E dá-lhe, nestas ocasiões, notícias e mais notícias lidas de sites da internet:
muita informação e pouco conteúdo!
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