Rádio Cruzeiro, a voz do poste do abrigo de bondes
2008
Luiz Artur Ferraretto

Anúncio da Rádio Cruzeiro (1942)
Fonte: GUIA OTTEN. Porto Alegre, 1942.

Quando se fala em voz do poste, a primeira associação de ideias remete, logo, a alguma cidade do interior brasileiro: pracinha, sol forte, céu azul, sombra de árvores, dia bonito, alto-falantes transmitindo recados e músicas, flerte entre os jovens no final de tarde... É claro que se trata de outro tempo. Na maioria das vezes, o de antes da chegada do rádio, pelo menos do rádio da emissora, aquele autorizado pelo governo federal. Pois, em muitos municípios, de pequeno porte ou maior, a curiosidade era tal, nos anos 1930 e 40, que construir um estudiozinho e, dele, puxar fios conectados a cornetas nos postes tornou-se algo comum no interior do Rio Grande do Sul. O que pouca gente sabe é que, na capital, Porto Alegre, também houve uma voz do poste.

Como registra o Guia Otten, publicação comercial daqueles tempos, chamava-se Rádio Cruzeiro. Tempos de poucos automóveis e muitos bondes. Milhares de pessoas convergindo para a Praça XV, no centro da cidade, encruzilhada do transporte urbano. Como dizia um anúncio da época, há, então, “uma voz nos abrigos da Praça XV ouvida por toda Porto Alegre” e, por este motivo, “proporcionando maiores lucros para os anunciantes”. De fato, não teria sido apenas uma voz do poste. O Guia Otten lista outra, ali perto, nos altos do Mercado Público, antepassada distante das emissoras internas que algumas grandes lojas ou shoppings mantêm, hoje, em parceria com estações de frequência modulada.

Desta, a Cruzeiro, rádio do abrigo de bondes da Praça XV, quem fala, vez por outra, é o jornalista Flávio Alcaraz Gomes. Segundo ele, o fascínio e a curiosidade pelo rádio eram tão fortes que muita gente boa começou a tentar uma carreira por ali, sendo ouvido pelos que vinham e pelos que iam nos simpáticos bondes elétricos da Carris Porto-alegrense. Simpáticos, é claro, para quem olha do presente, desconsiderando as faltas de conforto do passado, mas sonhando com a tranquilidade e a segurança daquela Porto Alegre menos metrópole, mais humana. Essa gente toda, passageira de bonde, quando chegava em casa podia continuar a sonhar com o rádio, sentando-se em frente a enormes aparelhos valvulados ou colocando singelos fones de baquelita de improvisadas galenas. Aí, era escolher entre a PRC-2 – Rádio Sociedade Gaúcha, a PRF-9 – Rádio Difusora Porto-alegrense ou a PRH-2 – Rádio Sociedade Farroupilha, que a Cruzeiro tinha mesmo ficado para trás nas cornetas dos postes do abrigo de bondes da Praça XV.

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